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Ibiquera: Possibilidade de extinção como municipio deixa moradores preocupados

Localizada na Chapada Diamantina, a pacata Ibiquera pode sumir do mapa. Pelo menos é o que sugere a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Pacto Federativo, apresentada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no início deste mês. A ideia prevê que municípios com menos de 5 mil habitantes e arrecadação própria menor que 10% da receita total sejam incorporados a cidades vizinhas. Esse é o caso de Ibiquera que possui 4.043 habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Além disso, a cidade tem a receita total no valor de R$ 15.628.980,43. Dessa quantia, o município arrecada R$ 344.873,06, o que representa um total de apenas 2,21% do montante, ou seja, porcentagem inferior a 10%. De acordo com o Ministério da Economia, há atualmente 1.254 municípios no país dentro desses parâmetros. Na Bahia, a lista é composta por dez cidades. O aposentado Valdemar Jesus classifica como “inacreditável” a proposta. Morador de Ibiquera desde quando o local pertencia a Itaberaba, a cerca de 100 quilômetros, ele teme a destruição da história do município que completou 61 anos de emancipação política em agosto deste ano.

“Chega a ser inacreditável que queiram acabar com a nossa cidade. Mesmo não tendo essa quantidade de habitantes, nós somos gente e ajudamos a construir a história do nosso município. Querem desmoralizar o nosso território e espero em Deus que isso não aconteça. Qual a vantagem disso?” questiona o aposentado, sendo apoiado pelos amigos ao redor. O comerciante Edilson Santos também demonstrou insatisfação com a ideia do presidente Bolsonaro. Proprietário de uma das poucas mercearias da localidade, ele acredita que as dificuldades no acesso à saúde, por exemplo, só iriam aumentar caso o município seja integrado a outro.

“É um absurdo tremendo depois de mais de 60 anos, Ibiquera voltar a ser distrito de outra cidade. A gente aqui com prefeito tem momentos que passamos por dificuldades, imagine se voltarmos a ser distrito. Vamos ter que se deslocar mais de 100 quilômetros para Itaberaba, por exemplo, para tratar da saúde. Os prefeitos de cidades maiores não estão dando conta de cuidar da cidade dele, imagine quando outro município se agrupar a ela”, disse. Acostumado com a tranquilidade, o comerciante diz que não pensa em sair do local o qual ele define como “o melhor do mundo”. “Não troco Ibiquera por lugar nenhum. Eu já estou adaptado a minha terra. Aqui só falta chuva, mas tirando isso não tem lugar melhor no mundo para se viver”, declarou.

Mas também não poderia ser diferente já que Ibiquera possui elementos de sobra de uma cidade típica do interior. Incrustada entre serras, o local exibe belas paisagens verdes e praças que se juntam ao silêncio, esporadicamente quebrado pelo barulho de crianças brincando em uma das 38 ruas existentes no município. O prefeito também partilha da mesma opinião dos munícipes. Ivan Almeida (PP) conta que logo após o anúncio da PEC, foi marcada uma reunião com uma equipe do IBGE para tratar do censo 2020, estudo estatístico que possibilita o recolhimento de informações, como o número de habitantes de cada município.

Para o gestor, a proposta não leva em consideração a história de cada lugar. “Estão pensando apenas na questão econômica e estão esquecendo da questão histórica e cultural de cada cidade. Os moradores da cidade ficaram assustados quando souberam, toda a região também. Estamos confiantes de que isso não vai adiante, até porque sabemos que isso não depende apenas do presidente”, pontuou o gestor, que se diz confiante com um novo censo a ser realizado pelo IBGE. “Acredito muito que nesse no censo do ano que vem a nossa cidade já tenha um avanço muito maior e significante”, completou.

Ibiquera poderia estar de fora da lista dos dez municípios baianos que podem ser extintos se mantivesse pelo menos o número de cerca de 7 mil habitantes que já chegou a ter, no entanto, segundo o prefeito, muitas pessoas deixaram o local por falta de oportunidades e por limitação ao acesso a direitos básicos, como a saúde. “Infelizmente as gestões passadas não cuidaram da forma que deveriam cuidar, deixando que as pessoas fossem embora por falta de cuidado. Faltou apoio para a agricultura para que as pessoas pudessem permanecer. Faltou apoio na geração de emprego. Com isso, o comércio começou a fechar as portas. Quando se fecha as portas isso gera o desemprego, gerando o desemprego as pessoas buscam novos caminhos”, ressaltou.

Sem trabalho e assistência, Ibiquera também perdeu comunidades rurais inteiras que passaram a integrar municípios vizinhos. Segundo o prefeito, o objetivo agora é repatriar essas localidades e com isso aumentar o número de habitantes. Mas independente disto, com o decorrer dos anos a cidade acabou atraindo novos moradores. É o caso da aposentada Lindaura Maria, de 81 anos, Natural de Mundo Novo, a cerca de 140 quilômetros de Ibiquera, ela afirma que presenciou os avanços significativos no local. “Depois que Ibiquera foi emancipada melhorou muita coisa. Acho que deve ficar como está. Nós não somos caranguejos para andar para trás, muito pelo contrário, queremos avançar cada vez mais e ver a nossa cidade evoluir cada dia mais”, contou.

A opinião dela é a mesma do centenário Manoel Souza, um dos moradores mais antigos do local. Sentado em uma cadeira na varanda de casa, é de lá que ele tem acompanhado as mudanças ocorridas na cidade. “Isso aqui melhorou muito e se voltar a ser distrito só vai piorar as coisas pra gente. Antigamente aqui era governado por Itaberaba. Tudo tínhamos que ir resolver lá. Lutamos tanto para termos a nossa independência e agora querem tirar de nós. Espero muito que isso não aconteça”, disse.

Apesar das melhorias, a arrecadação da cidade não acompanhou as evoluções citadas por dona Lindaura e seu Manoel. Questionado sobre a renda de Ibiquera, o prefeito afirma que o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) ainda é o principal responsável pela quantia que mantém o local. “O nosso ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços] ainda é pequeno, mas já foi menor, mas ainda assim continua baixo, em função de que o nosso comércio ainda não se auto sustenta da forma que deveria, então não tem aquela rentabilidade. No entanto, é perceptível que está havendo uma evolução. Vejo isso fazendo um comparativo com os anos passados em relação ao nosso ICMS e as nossas arrecadações”, justificou.

O FPM é uma transferência constitucional da União para os Estados e o Distrito Federal, composto de 22,5% da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). A distribuição dos recursos aos municípios é feita de acordo com o número de habitantes, onde são fixadas faixas populacionais, cabendo a cada uma delas um coeficiente individual.

Para o prefeito, a possível extinção da cidade pode gerar danos à localidade como o crescimento do desemprego, além da perda histórica. “A cidade perde sua identidade histórico-cultural e além disso vai gerar um desemprego muito grande. Eu acho que vai trazer um prejuízo enorme e não vai trazer benefício algum para o país. O prejuízo maior é jogar no lixo a cultura de uma cidade como Ibiquera que tem 61 anos, tem suas peculiaridades e não pode, num estalar de dedos, chegar e dizer que acabou como se fosse um comércio que entrou em falência porque não está vendendo bem”, lamentou. Com informações do BNews.

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